Conluio entre PSDB e mídia conservadora esvazia pedido de recontagem de votos
Por Redação - de Brasília
O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) prevê a análise, entre estas terça e quinta-feiras, do pedido de recontagem de votos da última eleição presidencial no país, após o pedido do PSDB para que seja verificada a “lisura” do processo de votação. A demanda, segundo apurou o Correio do Brasil, tende a ser arquivada, sob uma avalanche de críticas dos magistrados, após revelado o conluio entre a direção do partido e a mídia conservadora.
O candidato tucano derrotado nas urnas, Aécio Neves, perde estatura política após concordar com a decisão de seu partido que, nesta segunda-feira, foi alvo de alfinetadas de cinco dos sete ministros do Tribunal. Segundo o corregedor-geral, ministro João Otávio de Noronha, não há qualquer reparação ao resultado das urnas, no país, nem “nada que comprometa” a lisura do processo eleitoral.
O requerimento dos tucanos foi recebido com um profundo sentimento de indignação por parte dos magistrados e o ministro Noronha chegou a considerá-lo “prejudicial” à democracia. Seus pares chegaram a aplicar expressões como “desserviço” e “sentimento antidemocrático” para classificar a atitude dos perdedores. Durante o julgamento do pedido, no Plenário da Corte, estas expressões tendem a se repetir, posto não haver, segundo os magistrados que já leram a peça apresentada, “qualquer fato concreto” que sustente as suspeitas levantadas.
Armação na mídia
A ação protocolada com a assinatura do deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), coordenador jurídico da legenda, alega que a confiabilidade da apuração e a infalibilidade da urna eletrônica têm sido questionadas pela população nas redes sociais. Após as reações de indignação por parte de setores jurídicos, em todo o país, o que começou com um pedido de recontagem dos votos já mudou:
– Não tem nada a ver com pedido de recontagem dos votos nem estamos questionando o resultado. Só queremos evitar que esse sentimento de que houve fraude continue a ser alimentado nas redes sociais. O pedido é em defesa do tribunal – disse Sampaio a um site de notícias na internet.
Neves, o candidato tucano a presidente, recebeu votos de 51 milhões de eleitores (48,36%) contra 54,5 milhões (51,64%) da presidenta Dilma Rousseff (PT), reeleita para um mandato até 2018. O fato que gerou a petição do PSDB teria sido a série de denúncias publicadas nas redes sociais, mas há controvérsias.
Em artigo intitulado Uma bizarra simbiose, publicado neste fim de semana, na página do site Observatório da Imprensa, o jornalista e escritor Luciano Martins Costa agrava ainda mais o quadro de terrorismo político no qual está inserida a ação do PSDB junto ao Tribunal, ao perceber que o pedido de auditoria na eleição presidencial, de iniciativa do PSDB, dividiu o alto da primeira página da edição de sexta-feira do diário conservador paulistano O Estado de S.Paulo com a principal notícia de economia. “O Globo registra o assunto também na primeira página, mas em uma nota sem grande destaque, e a Folha de S.Paulo deixa o tema sem menção na primeira página e o coloca em posição secundária na editoria Poder“, acrescenta Martins Costa.
“O fato, incomum na rotina de manchetes compartilhadas pelos jornais que dominam a cena da mídia nacional, chama a atenção. A razão é explicada por um vazamento da redação do Estado: um dirigente do PSDB teria sondado editores sobre qual seria a receptividade do jornal àquela notícia. Com a garantia de que a iniciativa poderia sair em manchete, os autores da medida resolveram se arriscar à aventura de questionar o resultado das urnas, sem o risco de serem execrados pela imprensa por sua atitude vexaminosa”, afirma o articulista.
‘Calendário de horrores’
“Agora, imagine-se o contrário: se, derrotado na disputa presidencial, o Partido dos Trabalhadores resolvesse pedir uma investigação sobre a lisura do processo eleitoral. Evidentemente, não apenas as manchetes, mas os editoriais, os colunistas, os analistas econômicos, os filósofos, os psicólogos e outros “especialistas” hospedados na mídia tradicional, e até os astrólogos, estariam mobilizados para condenar a insinuação de que o partido governista colocava em dúvida a justeza da decisão popular. No mínimo, os descontentes seriam considerados maus perdedores, mas o tom geral seria de condenação a uma suposta tentativa de golpe de Estado”, acrescentou.
Martins Costa questiona: “E tudo motivado por análises técnicas? Não. O que move os reclamantes é uma série de manifestações de correligionários nas redes sociais. O episódio coloca a sexta-feira, 31 de outubro, no calendário de horrores criado pela simbiose bizarra entre a imprensa hegemônica e a oposição ao Executivo federal. Numa escala imaginária de despautérios, fica apenas alguns graus abaixo da manobra consumada no último fim de semana, às vésperas do segundo turno da eleição presidencial, por um panfleto de campanha distribuído sob o logotipo da revista Veja. Não por acaso, o assunto é explorado pelo carro-chefe da Editora Abril (leia aqui) e justificado por um de seus mais dedicados pitbulls”.
“A iniciativa do PSDB poderia ser considerada uma tolice, não fosse a revelação de que se trata de operação combinada com pelo menos um dos principais jornais do país. Qual seria o efeito de tal notícia no ambiente das redes sociais digitais? Evidentemente, essa manobra tende a acirrar o radicalismo na parcela mais aloprada do eleitorado, aquela que prega diariamente o golpe militar e até o assassinato de adversários como ação política legítima. Sua escalada pode gerar uma crise de governabilidade”, ressalta.
Polarização política
Segundo o jornalista , “o fato de um dos principais partidos do país buscar apoio nesse substrato da cidadania, onde se aglomeram os mais insensatos entre os analfabetos políticos, demonstra a falta de espírito democrático de seus dirigentes, entre os quais já se alinharam alguns intelectuais respeitados. O fato de um jornal de influência nacional embarcar na aventura golpista revela o baixio a que se dispõe a mídia tradicional. Mas a adesão de Veja não surpreende: a revista simboliza há muito tempo a destruição do legado de Victor Civita, processo que pode ser mais bem analisado à luz da psicologia freudiana do que sob as muitas teorias da comunicação”.
“Quanto aos observadores da mídia, desponta aqui um tema interessante para ser considerado: carece de fundamento a suposição, bastante difundida a partir da distribuição dos votos na última eleição, de que os mais educados entre os eleitores tendem a votar com mais racionalidade. A se julgar pelas manifestações de energúmenos que pregam medidas antidemocráticas como reação à decisão soberana das urnas, pode-se afirmar que é nos estratos com mais anos de escolaridade que se expressam a insensatez, o desatino e a irresponsabilidade”, alerta.
Um estudo do instituto norte-americano Pew Research Center sobre a polarização política nos Estados Unidos, citado no artigo de Martins Costa, “mostra que conservadores se informam por fontes menos diversificadas – por exemplo, 88% deles confiam na reacionária Fox News – enquanto os cidadãos mais liberais usam uma variedade maior de fontes de informação e opinião. Aplicada ao Brasil, a pesquisa provavelmente mostraria como a mídia partidarizada contribui para acirrar os ânimos e coloca em risco a própria democracia”, conclui.
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