Leia a transcrição da entrevista de Ricardo Lewandowski à Folha e ao UOL
Do UOL Notícias, em Brasília
Leia a transcrição da entrevista e assista ao vídeo:
http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2011/12/14/leia-a-transcricao-da-entrevista-de-ricardo-lewandowski-a-folha-e-ao-uol.htm
Ricardo Lewandowski – 13/12/2011
Narração de abertura: O ministro Enrique Ricardo Lewandowski tem 63 anos. É integrante do STF, Supremo Tribunal Federal. No momento, é também presidente do TSE, Tribunal Superior Eleitoral.
Lewandowski é formado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. Foi advogado, juiz e desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Entrou no STF em 2006, indicado pelo ex-presidente Lula.
Lewandowski assumiu a presidência do TSE em 2010, ano de eleição. Votou a favor da aplicação da Lei da Ficha Limpa já nas eleições de 2010, mas foi derrotado.
Folha/UOL: Olá internauta. Bem-vindo a mais um “Poder e Política Entrevista”.
Este programa é uma realização do jornal Folha de São Paulo, do portal UOL e da Folha.com. A gravação, como sempre, é aqui no estúdio do Grupo Folha em Brasília.
O entrevistado desta edição do “Poder e Política – Entrevista” é o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, e também presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o TSE.
Folha/UOL: Olá ministro, muito obrigado por aceitar o convite. Eu começo perguntando: o plebiscito no Pará [realizado em 11.dez.2011 para saber se os eleitores locais aceitavam dividir o Estado em três], foi bem sucedido? Quanto custou esse plebiscito?
Ricardo Lewandowski: O plebiscito foi muito bem sucedido. Mostrou que a Justiça Eleitoral está muito bem preparada para enfrentar eleições, plebiscitos e quaisquer outras consultas populares. O plebiscito custou R$ 19 milhões. A previsão inicial era de R$ 25 milhões, mas nós conseguimos fazer esse plebiscito por R$ 19 milhões. Dá uma média de R$ 4 por eleitor [do Pará] o custo do plebiscito. E dentro de duas horas a partir do término da eleição, do fechamento das urnas, nós já conseguimos ter o resultado matematicamente apurado e divulgado publicamente.
Folha/UOL: O custo desse plebiscito ficou mais ou menos na média de uma eleição geral no Brasil?
Ricardo Lewandowski: Sim. Ficou dentro da média. O custo das eleições presidenciais, computando o custo do primeiro e do segundo turno, foi de aproximada mente R$ 3,6 por eleitor. Agora um pouquinho mais caro, considerando inflação e os custos maiores de um Estado como o Pará, onde existem lugares inacessíveis, o deslocamento é mais custoso, a logística é mais complicada.
Folha/UOL: O sr. chegou a dizer que esse tipo de consulta à população pode ser realizado com mais frequência. Com que frequência seria viável fazer esse tipo de consulta?
Ricardo Lewandowski: Nós da Justiça Eleitoral defendemos que essas consultas sejam feitas, preferencialmente, com as eleições gerais e locais, que se sucedem a cada dois anos.
Folha/UOL: Isso já foi feito no Acre, não é?
Ricardo Lewandowski: Foi feito no Acre na questão do fuso horário [junto com as eleições de outubro de 2010]. Isso baratearia muito essa consulta popular e evitaria maiores problemas, maiores gastos. E a população sempre, de certa maneira, paralisa suas atividades para ir às urnas. Há todo o processo eleitoral, a propaganda. Então se fosse feito a cada dois anos seria muito mais conveniente.
Folha/UOL: A máquina de votar brasileira, aquela urna eletrônica, ela pode comportar uma eleição e uma consulta ao mesmo tempo?
Ricardo Lewandowski: Para as próximas eleições de 2012, nós já alteramos o programa de nossas urnas e ampliamos a memória de modo que o eleitor, quando for escolher o seu candidato, poderá também, concomitantemente, simultaneamente responder a alguma consulta.
Folha/UOL: Que tipo de consulta na sua opinião poderia ser colocada na urna na eleição geral de 2012 para prefeitos e vereadores?
Ricardo Lewandowski: Questões técnicas, mais sofisticadas, não se prestam a serem objetos de consultas populares. Por exemplo, a questão da relação homoafetiva, que acabou sendo decidida pelo Supremo Tribunal Federal, é o tipo de questão que poderia ser submetida à consulta popular. A questão do aborto dos fetos anencefálicos é também uma outra questão controvertida no Congresso Nacional e também ali no próprio tribunal...
Folha/UOL: Descriminalizacão de drogas como a maconha?
Ricardo Lewandowski: Perfeitamente. São questões relativamente simples, no que diz respeito à consulta. Podem ser respondidas com “sim” ou “não”. Por exemplo, se levasse uma consulta mais sofisticada... A divisão dos royalties do pré-sal. Isso é uma questão que comporta várias nuances, claro que é mais difícil de ser consultado ao povo.
Folha/UOL: Para que uma consulta dessa possa ser incluída já na eleição do ano que vem para todos os eleitores brasileiros, dependeria de o Congresso votar uma lei determinando à Justiça Eleitoral que incluísse essa consulta no processo eleitoral?
Ricardo Lewandowski: Perfeitamente. Como ocorreu com o plebiscito. Porque é preciso uma lei, é um comando que faz com que a Justiça Eleitoral atue e comece inclusive a buscar recursos para isso. Porque um plebiscito ou uma consulta popular demanda recursos e esses recursos só podem ser alocados mediante uma lei.
Folha/UOL: Quanto tempo seria necessário para que o Congresso aprovasse e desse tempo para a Justiça se preparar para o Ano que vem? Ou já passou o tempo?
Ricardo Lewandowski: Bem, olha, essa é uma pergunta muito interessante. Eu fiquei, como presidente do TSE e como presidente da Justiça Eleitoral brasileira, fiquei surpreendido com a rapidez da resposta da Justiça Eleitoral. Em menos de seis meses nós preparamos o plebiscito no Pará. Claro que foi localizado. Mas acho que nós não teríamos maiores dificuldades, em seis meses prepararmos um plebiscito.
Folha/UOL: Se até março [de 2012], meados de março, o Congresso decide incluir uma consulta no ano que vem sobre drogas, aborto, união homoafetiva, haveria tempo hábil?
Ricardo Lewandowski: Nós teríamos condições de responder afirmativamente a essa demanda.
Folha/UOL: Há os adeptos da consulta popular, da democracia mais direta, e há aqueles que temem um pouco isso até por experiências já ocorridas em outros países, na Europa, no início do século passado, na Alemanha. O sr. que opinião tem? Não é também um pouco perigoso fazer esse tipo de consulta popular e criar uma linha direta entre uma parcela grande da população que vai aí então deixar de lado as minorias?
Ricardo Lewandowski: Bem, a democracia chama participativa é um passo para além da democracia puramente representativa. Desde há muito tempo chegou-se a conclusão que há uma crise da democracia representativa. Quer dizer, o povo não se sente adequadamente representado por aqueles que estão no Congresso e no Executivo, no parlamento de modo geral. Bem, então os políticos e os juristas do mundo todo buscaram alternativas. E uma dessas alternativas é justamente propiciar ao povo, aos eleitores, a participação no processo político, na gestão da coisa publica, mediante determinados instrumentos. Por exemplo: o plebiscito, o referendo e a iniciativa legislativa popular que, aliás, entre nós, trouxe frutos importantes, como por exemplo a inclusão do artigo 41a na Lei das Eleições, que impede a compra de votos, a Lei da Ficha Limpa, controvertida, mas que ao meu ver é um avanço. Mas eu concordo que não se pode chegar a um extremo oposto que é introduzir entre nós a chamada democracia plebiscitária. Quer dizer, isso ensejaria um cesarismo, um populismo que seria totalmente indesejável.
Folha/UOL: Aí no caso talvez o ideal, não sei o que o sr. acha, seria que essas consultas tivessem exatamente esse caráter: sejam consultas, caráter consultivo para orientar o Congresso nas suas decisões.
Ricardo Lewandowski: Sem dúvida nenhuma. Eu acho que a democracia participativa jamais substituirá os representantes legitimamente eleitos. Essas consultas seriam importantes para subsidiar os parlamentares.
Folha/UOL: Para o ano de 2012 quais novidades já estão apresentadas que o eleitor deve esperar?
Ricardo Lewandowski: Estamos vivamente empenhados em avançar no processo da identificação biométrica dos nossos eleitores. Quer dizer, neste ano, no começo de 2012, preparando as eleições, pelo menos sete milhões de eleitores recadastrados.
Folha/UOL: O que é o reconhecimento biométrico?
Ricardo Lewandowski: O reconhecimento biométrico significa o seguinte, o eleitor se identificará mediante as suas impressões digitais. Portanto não haverá mais possibilidade de fraude ou erro na identificação do eleitor. Nós prevemos que, em 2018, quando o Brasil tiver cerca de 150 milhões de eleitores todos eles estarão recadastrados biometricamente.
Folha/UOL: O sr. acha que nós estamos muito longe ainda do dia em que haverá redes seguras por meio da internet para que os eleitores possam votar de algum lugar remoto, inclusive de suas casas?
Ricardo Lewandowski: Tecnicamente isso seria possível. Hoje nós fazemos transações bancárias de monta simplesmente digitando uma senha. O temor da Justiça Eleitoral e de todos aqueles que acompanham o processo eleitoral é justamente a coação dos eleitores. A possível coação dos eleitora. Imaginemos o seguinte, que numa grande empresa ou num sindicato, num grande sindicato, o presidente dessa empresa ou desse sindicato convoque todos os funcionários ou todos os membros do sindicato para votarem no mesmo dia num determinado candidato, com bandeira, com lanche etc. Então essa coação do eleitor nós ainda não conseguimos superar, essa possível coação do eleitor. Então quando alguém vai ao local de votação, está protegido pelas autoridades, pelo juiz eleitoral, pelos mesários, pela polícia e pelas forças de segurança do país, garantindo a mais livre expressão da sua vontade política.
Folha/UOL: Há muita crítica por parte daqueles que analisam as contas e a transparência das contas dos partidos e dos políticos nas eleições sobre como os partidos prestam as suas contas. Há mais facilidade de acesso sobre os candidatos do que sobre os partidos, que entregam depois. Eu não sei, o sr. me corrija, ainda entregam não totalmente ainda em formato digital, não fica facilmente disponível é possível melhorar isso aí?
Ricardo Lewandowski: Sim, nós estamos agora trabalhando na alteração das nossas resoluções para que haja uma padronização na entrega das contas, inclusive para facilitar o controle. Assim como ocorre com a Receita Federal, hoje há um programa padronizado. Nós brevemente introduziremos isso.
Folha/UOL: Os partidos políticos teriam que seguir regras semelhantes às que uma empresa, por exemplo, segue ao declarar o seu Imposto de Renda?
Ricardo Lewandowski: Exatamente. Com padrões e parâmetros definidos e iguais para todos.
Folha/UOL: E tudo eletrônico?
Ricardo Lewandowski: Tudo eletrônico.
Folha/UOL: Quando o sr. acha que isso poderá já estar disponível para que os cidadãos possam olhar no site do TSE e fiscalizar eles próprios?
Ricardo Lewandowski: Nós estamos fazendo força para que já nas próximas eleições possamos ter esse sistema.
Folha/UOL: Já em 2012?
Ricardo Lewandowski: Já em 2012.
Folha/UOL: Os partidos reclamam muito, os políticos também, que a arrecadação de fundos, doações de pequenos doadores pela internet no Brasil é muito difícil porque a legislação só permite ao candidato começar a receber dinheiro quando é candidato. Três meses antes da eleição. Então o tempo é curto. Diferentemente de países como os Estados Unidos onde se arrecada dinheiro o tempo todo. Como se resolve isso?
Ricardo Lewandowski: Eu defendi na eleição passada, isso publicamente, pela imprensa, que a campanha eleitoral deveria começar um pouco antes. Pelo menos no começo do ano relativo às eleições. Três meses [que é o tempo de campanha antes da votação permitido pela lei atual] é muito pouco para conhecer os candidatos. Então como um ano de antecedência ou um pouco menos de um ano, o começo do ano [eleitoral], o candidato ficaria mais exposto, poderia participar de debates, poderia participar de programas de televisão, para que o eleitoral o conhecesse efetivamente. O mesmo ocorreria com as doações de campanha. Eu acho que as doações são legítimas, embora eu defenda que as doações de pessoas jurídicas, de empresas devam ser banidas. Aceitaria a doação de pessoas físicas, dos indivíduos, como ocorre nos Estados Unidos. Se a pessoa tem o direito político de apoiar o candidato, até de trabalhar no comitê, por que ele não tem o direito também, se estiver convencido do acerto de sua escolha, de participar com uma determinada quantia em dinheiro. A campanha do Obama [Barack Obama, presidente dos EUA] foi uma campanha milionária, muito bem sucedida do ponto de vista financeiro e foi justamente abastecida por pequenas doações de eleitores por meio da internet.
Folha/UOL: O sr. não acha que os partidos são um pouco, com o perdão da palavra para os partidos, preguiçosos? Porque, veja bem, os partidos políticos, nada os impede, a qualquer tempo e época, de pedir dinheiro, doações para eles, partidos, pela internet. Eles poderiam pedir antes do processo eleitoral para que reforçasse a agremiação e aí ela pudesse usar na campanha.
Ricardo Lewandowski: Bem o que ocorre..
Folha/UOL: Algo impede os partidos de pedir dinheiro?
Ricardo Lewandowski: Não nada impediria. O que impede é... Como foi bem observado... Nós na verdade temos 29 partidos hoje legalmente existentes, registrados no TSE, mas na verdade são partidos sazonais. Eles só vivem no momento das eleições. Partidos verdadeiros que vivem durante todo o tempo são muito poucos.
Folha/UOL: Hoje em dia há uma situação relativamente esdrúxula na democracia brasileira, que está cada vez mais amadurecida, que é o fato de que um prefeito, alguém que ocupe um cargo público se declarar candidato, ainda que fora do horário de trabalho, enquanto ainda não é candidato, ele pode ser aí condenado por campanha fora de hora. Isso é realmente um fato? Alguém que é um prefeito, em março, em janeiro, fala: “Eu vou ser candidato em outubro novamente”. Ele está numa reunião, num restaurante com os amigos, é totalmente privado, fora do horário de trabalho. Ele é proibido de fazer isso?
Ricardo Lewandowski: É proibido. Eu penso que isso tem que ser disciplinado. É um pouco... Há um certa hipocrisia nisso. Porque o homem público é um homem político. É o ser político antes de mais nada.
Folha/UOL: Mas a lei, ela ativamente proíbe isso?
Ricardo Lewandowski: Proibe, claro. É campanha fora do período autorizado. Eu penso que nós podemos evoluir para que as pessoas se identifiquem como potenciais candidatos, como pré-candidatos, como existe nos Estados Unidos, por exemplo, as pré-convenções. Mas nós temos que proibir e vedar drasticamente o uso da máquina administrativa.
Folha/UOL: A lei, ela em certa medida já permite essa interpretação? Que o homem público, fora do horário de trabalho, sem usar a máquina pública, faça uma reunião com amigos num restaurante, onde que que seja. E se declare candidato. Hoje ninguém faz isso. Ou quando faz, fica com muito medo de ter seu nome vetado. O TSE poderia talvez numa resolução evoluir ele próprio para isso?
Ricardo Lewandowski: Talvez numa interpretação se fosse provocado. Mas nós tivemos um exemplo recente, de um homem público importante, um prefeito de uma capital que, após o expediente, ou nos dias em que não há expediente se dedicou à criação de um novo partido político. E não sofreu nenhuma sanção. É um comportamento que foi admitido, digamos assim. Ou pelo menos não foi contestado.
Folha/UOL: No ano que vem vamos ter, talvez, mais de 350 mil candidatos, a vereador e a prefeito. Esses candidatos todos, antes de serem candidatos oficiais, no Twitter: “sou pré-candidato a prefeito de cidade tal, vote em mim quando for a hora”. Ele pode ou não pode na sua opinião?
Ricardo Lewandowski: Olha, esta é uma questão difícil que não foi enfrentada ainda pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Folha/UOL: A isto não caberia uma resolução?
Ricardo Lewandowski: Não, não caberia porque isto é o campo realmente delimitado, exclusivo, do parlamento.
Folha/UOL: Ministro, vai ser uma guerra então no ano que vem, hein?
Ricardo Lewandowski: Sem dúvida nenhuma, vai ser uma guerra.
Folha/UOL: Facebook, Twitter etc.
Ricardo Lewandowski: Nós temos que estabelecer alguns limites. Eu acho que um limite bom é aquele limite que é tradicionalmente estabelecido pela Justiça é o limite do razoável, impedir abuso de lei. Toda vez que alguém abusa direito ele pode ser sancionado de alguma forma.
Folha/UOL: Uma situação objetiva: em janeiro, em março, alguém que se declara candidato ou pré-candidato, nesse caso o sr. acha...
Ricardo Lewandowski: Eu acho que já está na zona da ilegalidade. Como nós não reconhecemos as pré-candidaturas, ele realmente desequilibraria equilíbrio de forças dos demais que não se declararam [pré-candidatos].
Folha/UOL: O sr. recomendaria a quem quer ser candidato no ano que vem portanto que...
Ricardo Lewandowski: Cautela.
Folha/UOL: Cautela ao usar Twitter, Facebook, todas essas coisas, ao se declarar candidato?
Ricardo Lewandowski: Sem dúvida nenhuma. Ele pode eventualmente ser sancionado pelo juiz local, pelo Tribunal Regional Eleitoral local. Quer dizer, até a questão ser dirimida pelo Tribunal Superior Eleitoral, que pacifica o entendimento em relação a determinado assunto, ele pode sofrer uma sanção.
Folha/UOL: O PSD, um dos novos partidos recentíssimos do Braisil, tem uma ação que está para ser julgada no TSE sobre fundo partidário. Se tem direito ao fundo partidário de acordo com a proporção de deputados que entraram no partido na sua criação. O sr. tem a expectativa que isso possa ser julgado ainda agora nesse finalzinho de ano ou não dá mais tempo.
Ricardo Lewandowski: O ministro relator, que é o ministro Marcelo Ribeiro, ele determinou a citação de todos os partidos que possam eventualmente ser prejudicados por uma decisão favorável ao PSD.
Folha/UOL: Quase todos.
Ricardo Lewandowski: Pois é. Isso faz com que esse projeto seja projetado em tempo a conclusão desse processo. Eu acho que ele deve ser dirimido, deve ser julgado no ano que vem apenas. Esse ano não dará mais tempo.
Folha/UOL: Essa ação sobre o fundo partidário, que vai julgar a constituição de um novo partido e como ele deve ser considerado para efeito de fundo partidário também servirá de paradigma para outras considerações como, por exemplo, a distribuição do tempo de TV em anos eleitorais?
Ricardo Lewandowski: Ah, sem dúvida nenhuma. Quer dizer, porque a grande questão é a seguinte: se a legislação e também a jurisprudência do tribunal admite a migração de um político de um partido para outro, pelo menos para fundar um novo partido, este candidato que, legitimamente, migra de um partido para outro, para fundar outro, existe situação em que se admite inclusive a migração para um partido já constituído. Quando, por exemplo, o político sofre perseguições ou restrições no partido de origem. Então é saber se ele perde completamente as vantagens e os direitos que ele tinha ou se ele leva para o novo partido esses direitos que ele já possuía.
Folha/UOL: Esse assunto terá que ser dirimido até o início do horário eleitoral talvez, né?
Ricardo Lewandowski: Extamente. Nós vamos, tenho certeza, tenho a convicção, manifesto até minha esperança de que esse assunto seja levado a julgamento antes do início do horário, da propaganda eleitoral.
Folha/UOL: O TSE inaugura nesta semana sua nova sede em Brasília ao custo de R$ 327 milhões como foi noticiado. Era necessário?
Ricardo Lewandowski: Era absolutamente necessário. Muito necessário.
Folha/UOL: Por que ministro?
Ricardo Lewandowski: Primeiro porque nós estamos nesse prédio antigo há mais de 40 anos. Quer dizer: nós tivemos um crescimento exponencial do eleitorado, um crescimento exponencial dos processos que tramitam no TSE e também um aumento enorme no número de funcionários e de advogados e pessoas interessadas que transitam pelo prédio. Não temos lugar suficientes para abrigar as nossas seções. Nós temos as urnas são armazenadas num prédio fora do prédio sede. Quando há eleições nós precisamos construir um anexo para que s jornalistas acompanhem as eleições. As reuniões que nós fazemos periódicas de avaliação e de trabalho com os TREs são feitas em hotéis da capital porque nós não temos instalações adequadas.
Folha/UOL: Agora, tudo vai ser na nova sede.
Ricardo Lewandowski: Agora tudo será concentrado na nova sede.
Folha/UOL: Até o armazenamento de urnas?
Ricardo Lewandowski: Armazenamento de urnas.
Folha/UOL: Vai caber tudo lá?
Ricardo Lewandowski: Vai caber tudo.
Folha/UOL: Urnas do Brasil inteiro?
Ricardo Lewandowski: Sim, as urnas do Brasil... Quer dizer, claro que os TREs têm algumas urnas, mas nós temos as urnas, basicamente, temos muitas urnas para distribuição, as urnas que são adquiridas, as urnas que são transformadas, que estão em concerto. Nós temos um depósito enorme de urnas. E as urnas devem ser armazenadas em condições de total segurança. Do ponto de vista de possibilidade de incêndio, inundação. Agora nós teremos um local apropriado.
Folha/UOL: O sr. acha necessário fazer algum aperfeiçoamento na forma como são indicados e nomeados os juízes nos tribunais superiores?
Ricardo Lewandowski: Essa é uma questão polêmica. É uma questão polêmica. Com relação ao Supremo Tribunal Federal, especificamente, o que eu quero dizer é que nós temos um sistema que vigora desde 1891. Desde a primeira Constituição republicana. Então é um sistema que tem se provado correto. É o mesmo sistema adotado nos Estados Unidos da América. Nós aliá nós inspiramos no modelo norte-americano.
Folha/UOL: A diferença é que lá o Senado faz sabatinas muito mais extensas.
Ricardo Lewandowski: Bem esse é o problema do Senado né. Quer dizer: existem as sabatinas. Agora, talvez, o Senado pudesse estabelecer algum sistema de, digamos assim, de audiências públicas, de prévias, para... Pode ser aperfeiçoado.
Folha/UOL: Audiência pública seria de que forma?
Ricardo Lewandowski: Talvez subsidiar, digamos assim, os senadores, antes da sabatina.
Folha/UOL: Ouvir integrante da sociedade civil...
Ricardo Lewandowski: Da sociedade civil, especialistas, associações de magistrados, de advogados. Poderia haver uma participação um pouco mais intensa da sociedade. Mas o modelo em si me parece que é bom. Existem outras alternativas. Mas também essas alternativas possuem defeitos. Virtudes e defeitos. O STJ por exemplo, ele escolhe seus candidatos, faz uma lista prévia e depois vai para o presidente da República. Há críticas de que o processo fica muito fechado, fica muito na mão dos juízes do STJ. O CNJ também tem processo complexo de nomeação de seus integrantes, então parte deles são escolhidos pelo Senado e pela Câmara. Há uma intensa movimentação política dos possíveis candidatos. Isso é bom? Isso é ruim? Isso precisa ser avaliado criticamente também.
Folha/UOL: O ministro Joaquim Barbosa do Supremo Tribunal Federal tem dado a entender que no início de 2012 deve apresentar seu relatório no caso do mensalão. O sr. deve ser o ministro que vai fazer a revisão do processo. O sr. já está se preparando para isso. Como o sr. está encarando?
Ricardo Lewandowski: Esse processo será examinado por mim, terei que fazer um voto paralelo ao voto do ministro Joaquim. São mais de 130 volumes. São 38 réus do mensalão. São mais de 600 páginas de depoimentos. O revisor, ele produz um voto semelhante ao voto do relator. Ele precisa examinar a acusação, precisa verificar se a acusação está subsidiada por provas, amparada por provas. Precisa examinar a defesa. Se estiver convicto que um dos réus é culpado, ele precisa fazer a dosimetria da pena. É um processo complicado.
Folha/UOL: O sr. acha exequível a gente aguardar para o início do ano que vem esse processo... a entrega, se o ministro Joaquim Barbosa de fato entregar o relatório, a sua revisão, o início do julgamento?
Ricardo Lewandowski: Não. Quando eu receber o processo eu vou começar a examinar o processo. Vou começar do zero. Tenho que ler volume por volume porque não posso condenar um cidadão sem ler as provas.
Folha/UOL: No ano que vem, 2012, dois colegas do sr., ministro Ayres [Britto] e ministro Cezar Peluso completam 70 anos e vão se aposentar. Tem sido em geral um pouco lento o processo de substituição de ministros do Supremo. Supremo desfalcado, esse processo lento. É lícito supor que dificilmente o mensalão será concluído no ano que vem?
Ricardo Lewandowski: Sim, porque eu não posso, não tenho uma previsão clara. Quando eu receber o processo examinarei o processo com toda a seriedade que isso implica. Porque não se pode condenar alguém sem ler página por página do processo. Seria uma leviandade do magistrado.
Folha/UOL: O sr. prefere não fazer uma espécie de previsão, se é o ano que vem ou não?
Ricardo Lewandowski: Não sei as dificuldades que eu encontrarei. O ministro Joaquim, claro que ele fez toda a instrução do processo. Mas ele está com o processo há cerca de quatro anos, né? Então...
Folha/UOL: Muitos são réus primários ali.
Ricardo Lewandowski: São réus primários.
Folha/UOL: O sr. acha que corre o risco, inclusive com o passar do tempo, e depois eles podem recorrer, que essas penas para muitos ali sejam inclusive prescritas?
Ricardo Lewandowski: Sem dúvida nenhuma. Com relação a alguns crimes não há dúvida nenhuma que poderá ocorrer a prescrição.
Folha/UOL: E como a alguns são imputados apenas crimes de penas mais curtas podem não ser punidos?
Ricardo Lewandowski: Podem não ser punidos. Mas essa foi uma opção que o Supremo Tribunal Federal fez de fazer com que todos os réus fossem julgados no mesmo processo. Se apenas aqueles que tivessem foro privilegiado, exercendo mandato no Congresso Nacional fossem julgados no Supremo Tribunal Federal talvez esse problema da prescrição não existiria por conta de uma tramitação mais célere do processo. Eu naquele momento me manifestei no sentido que deveria ser desmembrado o processo.
Folha/UOL: E agora, enfim, tomou-se essa decisão sob o risco de muitos ali terem as penas prescritas.
Ricardo Lewandowski: Pois é. Talvez não se... O tribunal não tivesse antevisto a complexidade do processo. São 38...
Folha/UOL: Com a nomeação da ministra Rosa Weber que vai integrar o Supremo, finalizando o quadro completo de 11 ministros, o sr. acha que Ficha Limpa a gente pode aguardar um esforço do Supremo para, no início do ano ], apreciar de uma vez as pendências que existem nessa legislação?
Ricardo Lewandowski: Sem dúvida. Eu acredito que no começo do ano este assunto estará resolvido. Agora pelos pronunciamentos que já ouvimos dos ministros, nós temos já uma maioria no Supremo no sentido da constitucionalidade, pelo menos na grande parte dos dispositivos da Lei da Ficha Limpa. Para nós do ponto de vista da Justiça Eleitoral, o importante é que essa decisão saia antes das convenções partidárias, porque esse é o momento em que se define quem será ou não candidato.
Folha/UOL: No caso do senador eleito pelo Pará e que não pode assumir, Jáder Barbalho, esse caso, enfim, há uma razão objetiva para que ele não tenha sido julgado até agora e assumir o mandato. Agora o sr. não acha que o tribunal poderia se esforçar para evitar esse tipo de situação, esse tipo de conflito?
Ricardo Lewandowski: OIha, esse é um impasse que se deveu a uma circunstância de não estarem 11 ministros presentes em plenário. Houve o entendimento de cinco ministros de um lado e cinco ministros de outro de que... Uns entenderam que o chamado recurso de embargos de declaração não era cabível no caso para alterar a decisão anterior da corte. Outros cinco entendera que seria possível. Os embargos de declaração são cabíveis para sanar omissão, obscuridades ou contradições. Não para alterar o resultado de um julgamento. Agora, esse impasse, ao meu ver, seria facilmente resolvido se o candidato, o senador por meio de seu advogado desistisse dos embargos declaratórios, permitisse o trânsito em julgado dessa decisão que lhe foi desfavorável e ingressasse com outro tipo de recurso, outro tipo de ação que é a ação rescisória, juntamente com a medida cautelar. E ele então não teria, penso eu, maiores dificuldades em assumir o cargo de senador.
Folha/UOL: O sr. acha que aí nesse caso seria mais rápido do que esperar a decisão...
Ricardo Lewandowski: Sim, a questão é procedimental. Agora vem o recesso e a ministra [Rosa Maria Weber] deve assumir [sua vaga no STF]. Eu acredito que mesmo no recesso uma medida cautelar poderia eventualmente ser intentada e seria, eventualmente, tomada pelo presidente da corte.
Folha/UOL: Ele [Jader Barbalho] desiste do procedimento anterior, faz essa outra...
Ricardo Lewandowski: Essa ação rescisória... Essa seria a minha... Pelo menos na visão dos cinco que votação contrário à pretensão do senador seria uma saída procedimental mais adequada.
Folha/UOL: Porque parece que não há dúvida com relação à validade, a corte já decidiu, do Ficha Limpa no caso dele.
Ricardo Lewandowski: Claro, no mérito não há nenhum... O senador Jader Barbalho, ele mais cedo ou mais tarde, ele assumirá o cargo de senador. A questão é apenas procedimental, técnica.
Folha/UOL: Ele corre o risco de perder, se a ministra Rosa Weber decidir que não cabe o embargo. Daí ele teria que, de toda forma, entrar com essa...
Ricardo Lewandowski: Ação rescisória, que no plano do direito penal chama-se revisão criminal. São duas ações que servem para reparar injustiças ou erros judiciários.
Folha/UOL: Há no momento um debate no Congresso sobre conceder ou não um valor no orçamento que permita o aumento dos salários no Poder Judiciário. O sr. acha que é correta essa decisão de ter esse aumento de salário para o Poder Judiciário?
Ricardo Lewandowski: Na verdade não é o aumento de salário. É reposição das perdas salariais. Então o Poder Judiciário, os magistrados e também os servidores do Poder Judiciário estão há muitos anos sem a reposição. Estão defasados os seus vencimentos, os seus subsídios com relação à inflação.
Folha/UOL: Qual seria o melhor parâmetro para definir com clareza, para que a sociedade entenda, o que seria um salário justo por exemplo, para começar, do ministro do Supremo Tribunal Federal?
Ricardo Lewandowski: Bem, talvez comparar com a iniciativa privada. Ver qual é, quanto ganha o técnico equivalente em termos de conhecimento, preparo, experiência, ao ministro do Supremo Tribunal Federal, que o ministro do Supremo Tribunal Federal ganharia na iniciativa privada.
Folha/UOL: Com outros ministros de outros países, semelhantes ao Brasil em tamanho, PIB talvez?
Ricardo Lewandowski: É difícil comparar. Veja por exemplo: os salários ou os vencimentos ou os subsídios do ministro do Supremo Tribunal Federal, de início, logo, ele sofre um abatimento, uma redução de 27,5% por conta do Imposto de Renda. Depois mais um percentual relativo à Previdência Social. Depois o seguro médico que em todos os países é garantido pelo Estado aos seus servidores, especialmente do mais alto escalão, é arcado pelos próprios magistrados. Portanto, o valor nominal anunciado pela imprensa, no final ele sofre uma redução de cerca de 40%. Então na verdade o que ganha um magistrado, líquido, hoje não é aquilo que é anunciado.
Folha/UOL: É mais ou menos quanto o valor líquido que recebe um magistrado do Supremo?
Ricardo Lewandowski: Hoje, o Supremo Tribunal Federal, em média recebe cerca de R$ 16 mil líquidos.
Folha/UOL: No seu melhor juízo, o que seria um valor que seria justo para um ministro do Supremo receber?
Ricardo Lewandowski: [risos] Na Inglaterra dizem que o magistrado quando assume o cargo, ele recebe simbolicamente as chaves do tesouro significando que ele não tem um vencimento fixo mas ele recebe do tesouro britânico, aquilo que é necessário para ele ter uma vida digna. Então isso varia de país para país. Não quero me referir a uma importância determinada. Mas eu creio que hoje os magistrados estão bem remunerados, estão remunerados de maneira adequada, mas é preciso fazer a reposição relativamente a qualquer tipo de servidor ou qualquer tipo de empregado também na iniciativa privada.
Folha/UOL: O CNJ tem se manifestado, pelo menos uma parte do CNJ, sobre a regulamentação da participação de juízes e magistrados em eventos públicos onde os juízes acabam se relacionando com entidades, com pessoas que têm interesses nas decisões que são tomadas pela corte. Qual é a sua opinião sobre a participação de juízes em eventos que são patrocinados por entidade e empresas que tenham algum interesse nas decisões judiciais?
Ricardo Lewandowski: Não há nenhum congresso que não seja patrocinado por alguma entidade pública ou privada. Quando esse eventos são de natureza acadêmica, são públicos, e haja transparência no que diz respeito ao patrocínio financeiro desses eventos, eu não vejo nenhum problema. Porque é importante que os magistrados convivam com representantes do setor privado e ouçam também suas ponderações, mas é preciso que isso seja o mais transparente possível e sempre tenham natureza acadêmica.
Folha/UOL: A imagem desses eventos não é danosa ao Judiciário? Não seria melhor então fazer dentro da sede do Supremo, deve ter auditório, dentro da sede do TSE, chamar as entidades da sociedade civil para debater ali dentro em vez de ir aos hotéis?
Ricardo Lewandowski: O problema é que não há espaço para isso, como acabei de dizer, por exemplo, o TSE para fazer reuniões com os 27 TREs...
Folha/UOL: Mas e centros de convenções por exemplo, em vez de um hotel. Por exemplo aqui em Brasília há um centro de convenções bem grande.
Ricardo Lewandowski: Mas isso é feito regularmente. Há reuniões em centros de convenções. Acontece que todos os congressos têm sempre um momento de confraternização, um momento de lazer. Eu ouvi recentemente uma declaração do presidente da AMB, o desembargador Nelson Calanga, dizendo que determinados resorts que são alugados fora de temporada são mais baratos do que se fossem feitos nas capitais, Brasília, Rio de Janeiro, Belho Horizonte ou São Paulo. Então é uma questão de custo também.
O magistrado antes de tudo é um cidadão também. Quer dizer, ele deve estar... Se houver alguma irregularidade numa decisão que ele vier a proferir, algum favorecimento, ele será sancionado, quer dizer, o ordenamento legal tem instrumentos para isso. Ministério Público, CNJ, os advogados. Eu não vejo nenhum problema em relação à imparcialidade do juiz.
Folha/UOL: Ministro Ricardo Lewandowski muito obrigado por sua entrevista à Folha de S.Paulo e ao UOL.
Ricardo Lewandowski: Eu que agradeço a oportunidade e estou sempre à disposição desse importante jornal...
Folha/UOL: Muito obrigado.
Ricardo Lewandowski: ...que tanto tem contribuído para o progresso do país.
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