A um ano e meio sucessão presidencial, o padrinho político de Dilma Rousseff avalia que ela vai chegar em posição “muito confortável” a outubro de 2014. Lula chega mesmo a fazer um vaticínio: “Se a gente trabalhar com seriedade, humildade e respeitando nossos adversários e a economia estiver bem, com a inflação controlada e o emprego crescendo, acho que certamente a Dilma tem ampla chance de ganhar no primeiro turno.”
Lula concedeu uma entrevista às repórteres Vera Brandimarte, Cristiane Agostine e Maria Cristina Fernandes. A conversa está publicada na edução desta quarta-feira (27) do jornal ‘Valor’. No pedaço do dedicado à sucessão, Lula informou que, se Eduardo Campos (PSB) quiser mesmo disputar o Planalto, não pedirá que desista. “Não faz parte da minha índole pedir para as pessoas não se candidatarem porque pediram muito para eu não ser. Se eu não fosse candidato eu não teria ganho.”
Declara-se animado para a campanha. “Eu quero palanque”, afirma. Ainda rouco, Lula diz que os médicos já o liberaram. Rindo, diz que daria um jeito mesmo se houvesse restrições: “Se eu não puder [falar] eu levo um cartaz dela na mão.” Na montagem dos palanques estaduais, a prioridade do PT será Dilma. “Não podemos permitir que a eleição da Dilma corra qualquer risco. Não podemos truncar nossa aliança com o PMDB.”
Lula não descarta a hipótese de recandidatar-se em 2018. “Vai que, de repente, eles precisam de um velhinho para fazer as coisas. Não é da minha vontade. Acho que já dei minha contribuição. Mas em política a gente não descarta nada.” Recusou-se a falar sobre o julgamento do mensalão. Só dirá o que pensa depois que forem julgados os recursos dos condenados. Deu de ombros para a notícia sobre as 13 viagens que fez à África e América Latina com despesas pagas por empreiteiras.
“Se alguém tiver um produto brasileiro e tiver vergonha de vender, me dê que eu vendo. Não tenho vergonha de continuar fazendo isso”, declara, antes de perguntar: “Como é que viaja um Clinton? A serviço de quem? Pago por quem? Fernando Henrique Cardoso?” Acha que “tem pouca gente com autoridade de ganhar dinheiro como eu, em função do governo bem-sucedido que fiz neste país.” Vão abaixo algumas das frases ditas por Lula na entrevista:
— A saúde depois do câncer: Agora estou bem. Há um ano vou à fisioterapia todos os dias às 6h da manhã. Minha perna agora está 100%. Estou com 84 quilos. É 12 a menos do que já pesei mas é oito a mais do que cheguei a ter. Não tem mais câncer, mas a garganta leva um bom tempo para sarar. […] Quando falo dá muita canseira na voz. Já tenho 67 anos. Não é mais a garganta de uma pessoa de 30 anos.
— Avaliação sobre Dilma: O Brasil nunca esteve em tão boas mãos como agora. Nunca esse país teve uma pessoa que chegou na Presidência tão preparada como a Dilma. Tudo estava na cabeça dela, diferentemente de quando eu cheguei, de quando chegou Fernando Henrique Cardoso. Você conhece as coisas muito mais teóricas do que práticas. E ela conhecia por dentro. Por isso que estou muito otimista com o sucesso da Dilma e ela está sendo aquilo que eu esperava dela.
— A insatisfação dos empresários com Dilma: Não creio que haja má vontade dos empresários com a presidente. Passamos por algumas dificuldades em 2011 e 2012 em função das políticas de contração para evitar a volta da inflação. Foi preciso diminuir um pouco o crédito e aí complicou um pouco, mas Dilma tem feito a coisa certa. Agora tem conversado mais com setores empresariais. Acho que os empresários brasileiros, e eu vivi isso oito anos assim como Fernando Henrique também viveu, precisam compreender que uma economia vai ter sempre altos e baixos. […] O importante é não perder de vista o horizonte final. O Brasil está recebendo US$ 65 bilhões de investimento direto. Então não dá para se ter qualquer descrença no Brasil nesse momento. Nunca os empresários brasileiros tiveram tanto acesso a crédito com um juro tão baixo.
— Otimismo e popularidade: “…Se alguém ainda aposta no fracasso da Dilma, pode começar a quebrar a cara. Ela tem convicção do que quer. Esses dias liguei para ela e disse para tomar cuidado para não passar dos 100% [de aprovação nas pesquisas]. Porque há espaço para ela crescer. Vai acontecer muito mais coisa nesse país ainda. Não adianta torcer para não ter sucesso. Não há hipótese de o Brasil não dar certo.”
— A aproximação de Eduardo Campos com rivais como José Serra: Minha relação de amizade com Eduardo Campos e com a família dele, que passa pela mãe, pelo avô e pelos filhos, é inabalável, independentemente de qualquer problema eleitoral. Eu não misturo minha relação de amizade com as divergências políticas.
— A candidature de Eduardo Campos: Acho muito cedo pra falar da candidatura Eduardo. Ele é um jovem de 40 e poucos anos. Termina seu mandato no governo de Pernambuco muito bem avaliado. Me parece que não tem vontade de ser senador da República nem deputado. O que é que ele vai ser? Possivelmente esteja pensando em ser candidato para ocupar espaço na política brasileira, tão necessitada de novas lideranças. Se tirar o Eduardo, tem a Marina que não tem nem partido político, tem o Aécio que me parece com mais dificuldades de decolar. Então é normal que ele se apresente e viaje pelo Brasil e debata. Ainda pretendo conversar com ele. A Dilma já conversou e mantém uma boa relação com ele.
— A hipótese de Eduardo virar ministro para candidatar-se em 2018: Somente Dilma é quem pode dizer isso. Não tenho procuração nem do Rui Falcão [presidente do PT] nem da Dilma para negociar qualquer coisa. Vou manter minha relação de amizade com Eduardo Campos e minha relação política com ele. Até agora não tem nada que me faça enxergá-lo de maneira diferente da que enxergava um ano atrás. Se ele for candidato vamos ter que saber como tratar essa candidatura. O Brasil comporta tantos candidatos. […] Candidaturas como a do Eduardo e da Marina [Silva] só engrandecem o processo democrático brasileiro. O que é importante é que não estou vendo ninguém de direita na disputa.
— A especulação de que faria um apelo a Eduardo para não disputar: Não faz parte da minha índole pedir para as pessoas não se candidatarem porque pediram muito para eu não ser. Se eu não fosse candidato eu não teria ganho. Precisei perder três eleições para virar presidente. Eu não pedirei para não ser candidato nem para ele nem para ninguém. A Marina conviveu comigo 30 anos no PT, foi minha ministra o tempo que ela quis, saiu porque quis e várias pessoas pediram para eu falar com ela para não ser candidata e eu disse: ‘Não falo’. Acho bom para a democracia. E precisamos de mais lideranças.
— José Serra e Aécio Neves: O que acho grave é que os tucanos estão sem liderança. Acho que Serra se desgastou. Poderia não ter sido candidato em 2012. Eu avisei: não seja candidato a prefeito que não vai dar certo. Poderia estar preservado para mais uma. Mas Serra quer ser candidato a tudo, até síndico do prédio acho que ele está concorrendo agora. E o Aécio não tem a performance que as pessoas esperavam dele.
— A vitória em primeiro turno e a particular ‘se’: Não tem adversário fácil. O que acho é que Dilma vai chegar na eleição muito confortável. Se a gente trabalhar com seriedade, humildade e respeitando nossos adversários e a economia estiver bem, com a inflação controlada e o emprego crescendo, acho que certamente a Dilma tem ampla chance de ganhar no primeiro turno.
— Comícios X articulações de gabinete: Eu quero palanque. Vou lá ]em Pernambuco], vou em Garanhuns, vou no Rio, São Paulo, na Paraíba, em Roraima…
— Médicos já liberaram? Já. Se eu não puder eu levo um cartaz dela na mão (risos). Não tem problema. Acho que ela vai montar uma coordenação política no partido e eu não sou de trabalhar bastidores. Eu quero viajar o país.
— Volta em 2018? Não. Estarei com 72 anos. Está na hora de ficar quieto, contando experiência. Mas meu medo é falar isso e ler na manchete. Não sei das circunstâncias políticas. Vai saber o que vai acontecer nesse país, vai que de repente eles precisam de um velhinho para fazer as coisas. Não é da minha vontade. Acho que já dei minha contribuição. Mas em política a gente não descarta nada.
— A briga PT X PMDB no Rio: No Rio tem uma coisa engraçada porque nós temos o Pezão [vice de Sérgio Cabral, do PMDB], que é uma figura por quem eu tenho um carinho excepcional. Nesses oito anos aprendi a gostar muito do Pezão, um parceiro excepcional. E tem o Lindbergh Farias, senador do PT]. […]Eu não posso tirar dele o direito de ser candidato. Ele é um jovem talentoso, um encantador de serpentes, como diriam alguns, com uma inteligência acima da média, com uma vontade de trabalhar, como poucas vezes vi na vida. Ele quer ser.
— Como resolver a encrenca do Rio? Cabe ao partido sempre tratar com carinho, porque nós temos que ter sempre como prioridade o projeto nacional. Ou seja: a primeira coisa é a eleição da Dilma. Não podemos permitir que a eleição da Dilma corra qualquer risco. Não podemos truncar nossa aliança com o PMDB. Acho que o PT trabalha muito com isso e que Lindbergh pode ser candidato sem causar problema. Acho que o Rio vai ter três ou quatro candidaturas e ele, certamente, vai ser uma candidatura forte. Obviamente Pezão será um candidato forte, apoiado pelo governador e pela prefeitura. Na minha cabeça o projeto principal é garantir a reeleição de Dilma. É isso que vai mudar o Brasil.
— Um nome para São Paulo: Olha, acho que a gente não tem definição de candidato ainda. Você tem Aloizio Mercadante, que na última eleição teve 35% dos votos, portanto ele tem performance razoável. Tem o [Alexandre] Padilha, que é uma liderança emergente no PT, que está em um ministério importante. Tem a Marta [Suplixy] que eu penso que não vai querer ser candidata desta vez. Tem outras figuras novas como o Luiz Marinho, que diz que não quer ser candidato. Tem o José Eduardo Cardozo, que vira e mexe alguém diz que vai ser candidato e você pode construir aliança com outros partidos políticos. Para nós a manutenção da aliança com o PMDB aqui em São Paulo é importante.
— A possibilidade de apoiar o PMDB em São Paulo: Se tiver um candidato palatável, sim. Nós nunca tivemos tanta chance de ganhar a eleição em São Paulo como agora. A minha tese é a mesma da eleição de Fernando Haddad. Ou seja, alguém que se apresente com capacidade de fazer uma aliança política além dos limites do PT, além dos limites da esquerda. Como é cedo ainda, temos um ano para ver isso. Eu fico olhando as pessoas, vendo o que cada um está fazendo. E pretendo, se o partido quiser me ouvir, dar um palpite.
— O PSD de Kassab, o PTB e a hegemonia do PSDB: […] Temos que ter muito critério na escolha [de São Paulo]. A escolha não pode ser em função só da necessidade da pessoa, de ela querer ser. Tem que ser em função daquilo que é importante para construir um leque de aliança maior. Temos que costurar aliança, temos que trazer o PTB, manter o Kassab na aliança e o PMDB. Precisamos quebrar esse hegemonismo dos tucanos aqui em São Paulo, porque eles juntam todo mundo contra o PT. Precisamos quebrar isso. Acho que temos todas as condições.
— As denúncias pós-aposentadoria: Quando as coisas são feitas de muito baixo nível, quando parecem mais um jogo rasteiro, eu não me dou nem ao luxo de ler nem de responder. Porque tudo o que o Maquiavel quer é que ele plante uma sacanagem e você morda a sacanagem. É que nem apelido: se eu coloco um apelido na pessoa e a pessoa fica nervosa e começa a xingar, pegou o apelido. Se ela não liga, não pegou o apelido. Tenho 67 anos de idade. Já fiz tudo o que um ser humano poderia fazer nesse país.
— As viagens aos exterior custeadas por empreiteiras: O que faz um presidente da República? Como é que viaja um Clinton? A serviço de quem? Pago por quem? Fernando Henrique Cardoso? Ou você acha que alguém viaja de graça para fazer palestra para empresários lá fora?
— Autoridade para ganhar dinheiro: Algumas pessoas são mais bem remuneradas do que outras. E eu falo sinceramente: nunca pensei que eu fosse tão bem remunerado para fazer palestra. Sou um debatedor caro. E tem pouca gente com autoridade de ganhar dinheiro como eu, em função do governo bem-sucedido que fiz neste país. Contam-se nos dedos quantos presidentes podem falar das boas experiências administrativas como eu.
— Caixeiro viajante e a pena de Fernando Henrique: Viajo para vender confiança. Adoro fazer debate para mostrar que o Brasil vai dar certo. Compre no Brasil porque o país pode fazer as coisas. Esse é o meu lema. Se alguém tiver um produto brasileiro e tiver vergonha de vender, me dê que eu vendo. Não tenho nenhuma vergonha de continuar fazendo isso. Se for preciso vender carne, linguiça, carvão, faço com maior prazer. Só não me peça para falar mal do Brasil que eu não faço isso. Esse é o papel de um político que tem credibilidade. Foi assim que ganhei a Olimpíada, a Copa do Mundo. […] Você sabe que eu fico com pena de ver uma figura de 82 anos como o Fernando Henrique Cardoso viajar falando que o Brasil não vai dar certo. Fico com pena.
— O mensalão: Não vou falar por uma questão de respeito ao Poder Judiciário. O partido fez uma nota que eu concordo. Vou esperar os embargos infringentes. Quando tiver a decisão final vou dar minha opinião como cidadão. Por enquanto vou aguardar o tribunal. Não é correto, não é prudente que um ex-presidente fique dizendo ‘Ah, gostei de tal votação’, ‘tal juiz é bom’. Não vou fazer juízo de valor das pessoas. Quando terminar a votação, quando não tiver mais recursos vou dizer para você o que é que eu penso do mensalão.
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